A historia da maconha no mundo
A prova da associac?o Homo sapiens sapiens e Cannabis sativa mais antiga que se tem s?o as fezes fossilizadas de um membro de nossa especie que contem claramente vestigios de polen de Cannabis. Este cropolito foi achado as margens do lago Baikal, localizado na Asia Central, e datado em 10 mil anos. E provavel que a Cannabis tenha sido uma das primeiras plantas a serem domesticadas pelo homem ha 20 mil anos - varios e fortes indicios levam a essa conclus?o. Ha 15 mil anos, acredita-se, a planta ja era usada para a confecc?o de tecidos, cordas, fios, etc., no entanto, n?o se sabe se era ja inalada ou ingerida deliberadamente com a intenc?o de alterar a consciencia, Em todo caso, ha provas definitivas do uso cultural da Cannabis ha 6.500 anos naquela que e considerada a mais antiga cultura neolitica da China chamada Yang Chao. Nessa cultura, as fibras da planta eram usadas na confecc?o de roupas, redes de pesca e caca, cordas, etc., sendo que as sementes eram usadas na alimentac?o na forma de farinha, bolos, pudins e outras preparac?es.
O livro de medicina mais antigo que se conhece, o Pen-Ts'ao Ching, remonta ha 4 mil anos e fala do uso magico das inflorescencias femininas da planta: "Se tomada em excesso produzira a vis?o de demonios. Se tomada durante muito tempo ilumina seu corpo e o faz ver espiritos." Ha 3.500 anos, o Atharva Veda, livro sagrado dos hindus, tambem se referia a Cannabis na forma de Bhang, preparac?o esta que incluia a resina da planta misturada com manteiga e acucar. O Bhang era usado para "libertar da aflic?o" e para "alivio da ansiedade". Ainda hoje o Bhang e consumido livremente em algumas partes da India pelos recem-casados na noite de sua lua-de-mel, como afrodisiaco. A religi?o hinduista acredita que a Cannabis e um presente dos Deuses. De fato, diz-se que a planta teve origem quando Shiva (uma das personalidades de Deus na triade dessa religi?o), chegando a um banquete preparado por sua esposa Parvati, saliva ao ver tantas delicias e de sua saliva surge a planta abencoada.
Os Shivaistas, devotos de Shiva, fumam continuamente a ganja (a planta feminina) com o charas (a resina das flores) para meditarem e se elevarem espiritualmente. Eles consideram que o chillum - o cachimbo onde a planta e fumada - e o corpo de Shiva, o charas e a mente de Shiva, a fumaca resultante da combust?o da planta e a divina influencia do Deus e o efeito desta, sua misericordia. Os Citas tambem faziam uso magico-religioso da Cannabis. Esta era privilegio dos nobres que se reuniam para consumi-la em tendas especialmente construidas para este fim. Essas tendas eram montadas sobre as areias do deserto e um grande buraco era aberto onde se queimavam toras de madeiras aromaticas. Quando estas estavam em brasa, tres ou quatro pes da planta eram jogados inteiros no buraco que era ent?o coberto com uma tampa feita de pele de carneiro, exceto por uma abertura em torno da qual os participantes se reuniam para gozarem dos vapores que se elevavam. Isso ha 2.800 anos.
Os Assirios conheciam a planta a qual chamavam Kunubu ou Kunnapu, que veio dar no latim Cannabis. A planta era cultivada pelo rei, que a distribuia diariamente, junto com um litro e meio de cerveja, para todos os cidad?os, num claro exemplo de uso hedonistico, n?o anomico. As qualidades medicinais da planta est?o descritas em escrita cuneiforme num dos livros mais antigos da humanidade e que fazia parte da Biblioteca de Assurbanipal ha 2.700 anos. Este livro pode ser visto hoje no British Museum em Londres.
Entre os gregos, a Cannabis, na forma de haxixe, era ingerida junto com o opio na celebre preparac?o (descrita por Homero) chamada nepenthes, que aliviava as dores, angustias e preocupac?es. Devido a proibic?o do Cor?o ao uso do alcool, desde sempre o haxixe e a Cannabis tem sido o embriagante preferido dos povos islamicos. Sendo considerada pura, a planta e passivel de ser usada pelos crentes. A celebre seita dos haxixin, liderada pelo afamado Al-Hassan Ibn-Al Sabbah, o Velho da Montanha, fazia uso da planta. Seu lider levava os membros a um recinto onde estes fumavam haxixe em meio a um lauto banquete servido por jovens e belas mulheres que lhes atendiam em todos os seus desejos. Apos isto, o Velho da Montanha lhes dizia que assim gozariam do paraiso de Allah caso cometessem assassinatos politicos que favorecessem a seita. A palavra assassino tem origem a partir deste episodio, ja que os membros da seita eram chamados de haxixin. E certo que os cruzados que os combateram aprenderam destes o uso do haxixe, levando-o consigo de volta a Europa.
Com a islamizac?o do norte da Africa, a planta se espalha rapidamente por este continente e breve n?o so os povos islamizados dela fazem uso entusiastico como tambem as tribos animistas do resto da Africa. Um rei africano apresentado a erva, converte-se a seu culto e a tribo passa a se chamar Bena Riamba - "os irm?os da Cannabis". Todo dia ao por-do-sol, os membros desta tribo se reunem em roda no patio central da aldeia para fumar a planta. Antes de passar o cachimbo, olham-se nos olhos dizendo: "Paz irm?o da Cannabis". Representantes desta tribo s?o ate hoje encontrados na costa sul de Mocambique. Assim como os Bena Riamba, muitas outras tribos se convertem ao uso da planta, incorporando-a em destaque no seu pante?o. A palavra maconha, nome pelo qual a planta e conhecida entre nos, vem de Ma Konia, m?e divina, num dialeto da costa ocidental africana. Apesar de se saber que as caravelas portuguesas tinham seu velame e cordame feitos da fibra do canhamo (Cannabis sativa), acredita-se que a Cannabis tenha sido introduzida no Brasil pelos negros escravos que para ca foram trazidos. Os nomes pelos quais a planta e conhecida no Brasil indicam tal fato, ja que s?o todos nomes de origem africana: fumo d'angola, Gongo, Cagonha, Maconha, Marigonga, Maruamba, Dirijo, Diamba, Liamba, Riamba e Pango. Este ultimo vem do sanscrito Bhang, atraves do arabe Pang, ate o africanismo pango. De toda forma, a planta esteve desde o inicio associada a populac?o de origem africana, sendo que a ampliac?o de seu uso, atingindo tambem aqueles de origem europeia, era considerada por autores como Rodrigues Doria como: "uma vinganca da raca dominada contra o dominador". Os cultos afro-brasileiros sempre utilizaram a Cannabis. Ja no seculo XVIII, os relatos sobre os calundus - reuni?o de negros ao som de tambores - indicavam a presenca da planta, que era inalada pelos participantes, deixando-os "absortos e fora de si". Ate a decada de 30 do seculo XX, quando s?o legalizados os Candombles e Xangos, a Cannabis era constantemente apreendida nos terreiros junto com os objetos de culto. A Cannabis e considerada planta de Exu, sendo consagrada a esta divindade.
Em 1830, a legislac?o do municipio do Rio de Janeiro punia o uso do "pito de pango", como era conhecida a Cannabis, com pena de multa de 5 mil reis ou dois dias de detenc?o, esta foi nossa primeira lei a respeito da planta.
Nas decadas de 20 e 30 deste seculo, s?o produzidos os primeiros trabalhos cientificos brasileiros a cerca do habito de fumar a Cannabis. Apesar de seus autores serem em sua quase totalidade medicos preocupados em justificar a proibic?o da planta, estes tinham um olhar etnografico sensivel, descrevendo com minucias os rituais do "clube de diambistas", nome dado a associac?o de individuos com o intuito de fumar Diamba. Os diambistas eram, preferencialmente, membros dos estratos mais baixos da populac?o brasileira, em especial pescadores que se reuniam para fumar a erva cantando loas a esta. S?o dessa epoca os famosos versos: "Diamba, sarabamba, quando fumo Diamba, fico com as pernas bambas. Fica sinho? Dizo, dizo". Termos utilizados pelos diambistas, como "fino", "morra" e "marica" entre outros, s?o ate hoje parte da giria propria dos usuarios da Cannabis.
A distribuic?o geografica do consumo da Cannabis na epoca incluia Alagoas, Sergipe, Pernambuco, Maranh?o e Bahia. Dai, pouco a pouco o habito se espalha e, a partir da decada de 60, com a contra-cultura, passa a atingir outros estratos sociais. Atualmente, seu uso e amplamente disseminado entre as camadas medias urbanas. Tambem os povos do novo mundo n?o ficaram imunes a Cannabis. Hoje em dia no Brasil, os Mura, os Satere-Mawe e os Guajajaras fazem uso tradicional da erva. Os Guajajaras tem a planta em alta estima e sua presenca na mitologia do grupo atesta a antiguidade de seu uso, que remontaria a segunda metade do seculo XVII. A planta e consumida no contexto xamanico, junto com o tabaco, para propiciar o transporte mistico do paje e na divinac?o. No contexto profano, a erva e inalada em grupo antes de trabalhos pesados nos mutir?es para dar disposic?o, indicando que a chamada "sindrome amotivacional" - associada a Cannabis - possa ser um fenomeno antes cultural do que uma decorrencia dos seus principios ativos. Os dados jamaicanos parecem confirmar essa tese, uma vez que nesse pais a Cannabis e amplamente fumada por trabalhadores rurais como estimulante antes de trabalhos pesados e extenuantes.
Outros nativos da America tambem usam a Cannabis, entre os quais est?o os indios Cuna do Panama, que ja possuiam escrita antes da chegada dos europeus, os indios Cora do Mexico, e outros. Hoje em dia existem religi?es organizadas onde observa-se o uso da Cannabis. Para os Rastafari da Jamaica, a planta e Kaya, a energia feminina de Deus. Seu uso diario naquilo que e chamado "Irie meditation", a meditac?o na energia positiva, e justificado pelas seguintes passagens da Biblia, no Genesis: "Eu sou Jeova teu Deus, eis que te dou toda a planta que ha sobre a terra, e que da semente nela mesma, para que fazeis bom uso dela" e no livro das revelac?es, o Apocalipse, quando descreve o paraiso: "Vi tambem a arvore da vida, cujas folhas s?o a cura das nac?es".
Para a doutrina do Santo Daime, a planta e sagrada e identificada com Santa Maria, a m?e de Jesus. Para consagra-la, e necessario aderir a um uso cultural diferenciado, sendo a planta consumida exclusivamente durante os rituais, em silencio, com o pito, a denominac?o nativa para baseado, passado sempre no sentido anti-horario, isto e, da direita para a esquerda. Devido a longa historia de associac?o entre nossa especie e a Cannabis, esta apresenta um grande polimorfismo decorrente de inumeras hibridizac?es levadas a cabo com a intenc?o de desenvolver plantas com qualidades desejadas. Sendo uma planta dioica, ou seja, possuindo os sexos separados em duas plantas: uma macho e outra femea, o genero Cannabis compreende tres especies distintas: sativa, indica e ruderalis.
Posted by Arnaldo Bhauretts
at 06:12 BRST
Updated: 21/06/2004 06:31 BRST